Dona Lúcia e os Mistérios do Entardecer.
No início da tarde, Dona Lúcia era uma senhora tranquila. Gostava de ficar sentada na varanda, observando os passarinhos e tomando café com leite. Conversava pouco, mas sempre tinha um sorriso suave no rosto. Porém, bastava o sol começar a se pôr para que algo mudasse.
— Quem são essas pessoas na sala? — perguntava, franzindo a testa.
Não havia ninguém. Apenas eu e ela.
— Acho que estão querendo levar minhas coisas… — continuava, olhando para o corredor vazio.
Eu tentava explicar, mostrar que tudo estava no lugar, mas seus olhos inquietos vagavam pelo ambiente como se buscassem algo invisível para mim.
Uma vez, logo após o jantar, ela pegou sua bolsa e começou a caminhar em direção à porta.
— Para onde a senhora vai, Dona Lúcia?
— Preciso ir pra casa. Está tarde, minha mãe deve estar preocupada.
A mãe de Dona Lúcia havia falecido há mais de quarenta anos.
Eu respirei fundo. Se dissesse a verdade, ela ficaria assustada ou até zangada. Então, optei por um desvio:
— Está muito frio lá fora, Dona Lúcia. Que tal esperar um pouquinho e tomar um chá antes de ir?
Ela hesitou, mas acabou sentando-se novamente, ainda segurando a bolsa com força.
O tempo passava e, aos poucos, os olhos dela perdiam aquela expressão de urgência. O chá, o tom de voz calmo e a luz suave da sala faziam seu corpo relaxar. Quando percebi, já não falava mais da mãe nem da casa.
O sol desapareceu completamente, e Dona Lúcia voltou a ser a senhora tranquila da varanda.
Amanhã, ao entardecer, tudo começaria de novo. Mas, por hoje, o mistério da noite havia sido suavemente contornado.
Se você cuida de alguém com Alzheimer e percebe que o entardecer traz inquietação e confusão, saiba que não está sozinho. Pequenas mudanças no ambiente e na abordagem podem fazer toda a diferença. Continue acompanhando o Memória Viva para mais dicas e histórias reais!
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